AMANDA
Quando me apercebo sou míope e sem mais nem menos as coisas parecem ainda mais difíceis de focar. Não é uma questão de concentração, é só uma questão de focagem. Perdi aquele lugar em que os olhos se alinham com o poder imagético do mundo. Não sei que imagem é a minha, muito menos que lugar devo ocupar. Há aquela banqueta da varanda que está quase sempre ao sol durante o dia: a verdade é que não é suficiente. Nada, na verdade, é suficiente. Se fechar os olhos e os apertar com força, reconheço os teus contornos, mas não sei exactamente definir as linhas do teu rosto. Há um rosto que conheço bem, o da Patrícia. O teu parece-me só uma memória deslavada por uma impressão. Perto de ti podia ser um homem cujas mãos te abraçam. Perto de ti, ainda que mal me lembre da tua expressão, tenho as mãos grandes e possantes. Podia ser uma égua, um animal irado só pela tua memória. A verdade é que nunca quis ser um homem, nem mesmo hoje que te conheço e te quero proteger. Fizeste com que me levantasse da banqueta ensolarada, por escassos minutos, enquanto te fazias sentir no portão da minha casa. Estranha criatura. Quase me fazes querer ser este homem desfocado, míope em que me torno todos os dias e em que mais uma vez recuso o meu corpo e o massacro por falta de alternativa. Fiquei planada à janela enquanto passavas. Espreitei o desenho do teu corpo no vestido que trazias. A Patrícia estava no quarto e perguntava pela quarta vez se queria sair para jantar com ela numa esplanada simpática. O meu dia adormecido não parecia encher-se de maiores expectativas pelo convite. Antes tu e o teu vestido de Verão que ondulava entre as tuas coxas e os teus joelhos; antes tu passeando em frente ao meu portão enquanto eu te espreitava pela janela. É nestes segundos em que te contemplo, uma imagem virgem e etérea, que desejo ser um homem cuja carteira está perdida algures num bar. Prefiro não ter identidade quando te vejo para que a culpa não me petrifique ainda mais a esta casa e a este chão cujo cheiro já não suporto. Sinto-me desfocada e não há espelho que suporte o meu reflexo inerte.
Quando me apercebo sou míope e sem mais nem menos as coisas parecem ainda mais difíceis de focar. Não é uma questão de concentração, é só uma questão de focagem. Perdi aquele lugar em que os olhos se alinham com o poder imagético do mundo. Não sei que imagem é a minha, muito menos que lugar devo ocupar. Há aquela banqueta da varanda que está quase sempre ao sol durante o dia: a verdade é que não é suficiente. Nada, na verdade, é suficiente. Se fechar os olhos e os apertar com força, reconheço os teus contornos, mas não sei exactamente definir as linhas do teu rosto. Há um rosto que conheço bem, o da Patrícia. O teu parece-me só uma memória deslavada por uma impressão. Perto de ti podia ser um homem cujas mãos te abraçam. Perto de ti, ainda que mal me lembre da tua expressão, tenho as mãos grandes e possantes. Podia ser uma égua, um animal irado só pela tua memória. A verdade é que nunca quis ser um homem, nem mesmo hoje que te conheço e te quero proteger. Fizeste com que me levantasse da banqueta ensolarada, por escassos minutos, enquanto te fazias sentir no portão da minha casa. Estranha criatura. Quase me fazes querer ser este homem desfocado, míope em que me torno todos os dias e em que mais uma vez recuso o meu corpo e o massacro por falta de alternativa. Fiquei planada à janela enquanto passavas. Espreitei o desenho do teu corpo no vestido que trazias. A Patrícia estava no quarto e perguntava pela quarta vez se queria sair para jantar com ela numa esplanada simpática. O meu dia adormecido não parecia encher-se de maiores expectativas pelo convite. Antes tu e o teu vestido de Verão que ondulava entre as tuas coxas e os teus joelhos; antes tu passeando em frente ao meu portão enquanto eu te espreitava pela janela. É nestes segundos em que te contemplo, uma imagem virgem e etérea, que desejo ser um homem cuja carteira está perdida algures num bar. Prefiro não ter identidade quando te vejo para que a culpa não me petrifique ainda mais a esta casa e a este chão cujo cheiro já não suporto. Sinto-me desfocada e não há espelho que suporte o meu reflexo inerte.
Sem dúvida que há uma relação entre a Laura e a Amanda...já o sabíamos desde início e à medida que se vai focando a miragem de um produto final, cada vez há mais certezas!
ResponderEliminarObrigada por este texto e por todos os outros que tens escrito...todos têm também bastante da Laura!
Inês S.